Abdoulaye e as constipações

No meio da confusão instalada na Liga Portuguesa, a não utilização do central Abdoulaye por parte do Vitória de Guimarães na visita ao Dragão acabou por ser mais um episódio caricato, neste já de si pouco normal campeonato português. O central emprestado pelo Porto aos vimaranenses foi convocado, mas uma questão médica de última hora colocou-o na bancada, facto justificado de modo mais ou menos atabalhoado por Rui Vitória. Havendo ou não reais razões para o jogador ficar de fora, a suspeita ninguém a apaga, até porque não é a primeira vez que um jogador emprestado a determinado emblema é acometido de uma súbita maleita na véspera de jogar contra o clube que o emprestou (por norma os jogadores constipam-se nessa manhã). Verdade seja dita, a questão do jogadores emprestados lembra a história do rapaz, do velho e do burro. Se o jogador não joga, falam-se em pressões, se joga e marca um golo, o clube que empresta é apelidado de "burro" porque o deixa jogar, por fim, se o jogador joga e joga mal, é acusado de o ter feito propositadamente de modo a beneficiar o patrão. Esta situação é ainda mais empolada pelo facto dos principais fornecedores de jogadores, normalmente os emblemas mais poderosos financeiramente, serem actualmente FC Porto e Benfica, rivais no relvado e no bastidores. Para lá de poderem beneficiar de lesões de última hora, estes dois clubes possuem de momento a capacidade de manobrar o campeonato, pois conseguem fortalecer outras equipas consoante a sua estratégia no momento (ainda por cima porque as dificuldades financeiras da maior parte das equipas portuguesa quase as colocam à mercê da bondade dos mais ricos). Então, que fazer para terminar com este clima de suspeição, e aumentar a credibilidade da Liga Portuguesa? Algumas propostas:

- não permitir empréstimos dentro da Liga. Hipótese já tentada, tem como vantagem não haver conflito de interesses. O ponto negativo é que obrigaria jogadores talentosos a irem rodar no estrangeiro, ou nas divisões secundárias, o que iria ainda diminuir a quantidade de talento a jogar nos relvados nacionais.
- não permitir que os emprestados joguem contra os clubes de origem. Clarifica a situação (há uma regra objectiva, justa ou não), mas por outro lado enfraquece à partida a equipa perante o adversário que lhe emprestou os jogadores, podendo no entanto defrontar todos os outros na máxima força.
- limitar o nº de jogadores a emprestar/receber. Cada equipa poderia apenas colocar um número limitado de jogadores em clubes do mesmo campeonato (por exemplo, cinco), enquanto que um determinado clube pode receber também um número limitado (digamos, três). A questão da suspeição existe, mas é diluída... não é possível uma equipa mais forte abastecer um ou dois parceiros de eleição, e o efeito lesão súbita não é tão determinante.
- não permitir que um jogador seja emprestado mais que dois anos seguidos. Pode prejudicar a evolução de um atleta, mas também evita que esse jogador reforce potenciais aliados de um modo contínuo.

Os empréstimos tornam a competição menos justa? Alguns treinadores são convidados a deixar jogadores de fora perante certos adversários, ou estamos perante rumores infundados? Mesmo assim, a própria nuvem de suspeição, mesmo que injusta, não deveria obrigar os agentes do futebol a tomar uma posição? Um ponto parece assente: mesmo com protestos a saltarem para a praça pública de quando em vez, os clubes parecem satisfeitos com o status quo; os mais fortes colocam os seus excedentários e jovens, os mais fracos recebem reforços quase que a la carte...

Visão do Leitor (perceba melhor como pode colaborar no VM aqui!): Nuno Ranito

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